1) Que vantagens vê numa formação académica em Jornalismo/Comunicação para o exercício da profissão de jornalista?
Não tenho uma resposta categórica para esta questão. Diria apenas que depende de que exercício da profissão de jornalista se trata e de que formação académica se trata. Há atividades jornalísticas para as quais é mais importante ter, por exemplo, uma formação jurídica, económica e há atividades jornalísticas para as quais nem será preciso qualquer formação académica, como por exemplo, a atividade dos jornalistas que se limitam a recortar e a colar despachos de agências noticiosas. É por isso que sempre defendi a autonomia dos cursos de comunicação em relação ao exercício de qualquer profissão. Muitas das atividades profissionais aprendem-se no terreno, nas empresas. As vantagens da formação académica qualquer que ela seja, em jornalismo, tal como em direito, em medicina, em engenharia ou em qualquer curso académico dependem daquilo que os diplomados nesses cursos fazem dela, das qualidades pessoais de cada um. É por isso normal que haja excelentes profissionais que não têm qualquer formação académica ou formação académica noutra área e excelentes académicos que seriam péssimos profissionais. Já Aristóteles distinguia claramente duas modalidades de inteligência, a que tem a ver com a episteme e a que tem a ver com a techné. Pode-se ter um excelente domínio da techné e não ter capacidade no domínio da episteme e vice-versa. É claro que o ideal seria ser competente nas duas esferas, mas nós sabemos que não somos seres ideais.
2) Que resposta deve a formação académica dar aos efeitos da associação do mercado e das novas tecnologias ao jornalismo?
A formação académica não existe para dar resposta aos efeitos do mercado. Para isso existe a esfera da luta política dos cidadãos. A formação académica está a montante dessa esfera: tem por função formar cidadãos esclarecidos capazes de escolherem as suas lutas e de as levarem para a frente com determinação e solidariedade.
3) Defende uma formação sobretudo técnica (estudo e prática da técnica profissional) ou alicerçada numa componente mais reflexiva (estudo do jornalismo integrado no universo mais vasto da comunicação)? Porquê?
Depende dos objetivos que as pessoas têm para as suas vidas. Há certamente pessoas que procuram uma formação técnica e, nesse caso, podem encontrar a resposta aos seus objetivos junto das empresas que melhor podem assegurar essa formação. Mas há pessoas que procuram uma formação que os habilite a pensar e a refletir e nesse caso creio que nas sociedades ocidentais é sobretudo à Universidade que compete responder a esse objetivo. O que a Universidade nunca poderá satisfazer são os objetivos meramente técnicos, porque não é esse a sua missão nem é essa a sua competência.
4) Que ligação deve existir entre a academia (cursos de jornalismo) e a profissão, durante o período letivo e na fase de estágio?
Deve haver uma ligação de mero enquadramento e colaboração. Seria desastroso que a Universidade dependesse dessa ligação e que passasse a definir o perfil da sua formação em função da demanda profissional, tal como seria desastroso que os objetivos empresariais das empresas jornalísticas dependessem dos objetivos universitários. No mundo moderno, qualquer confusão entre a esfera empresarial e o domínio académico é intolerável, porque não respeita a autonomia de cada uma das esferas. Isto não quer dizer que não haja uma colaboração clara e proveitosa, mas ela será tanto mais proveitosa quanto mais respeitadora da autonomia das duas esferas.
Adriano Duarte Rodrigues | professor e investigador UNovaLisboa