Arquivo mensal: Maio 2015

Números#3

Decréscimo acentuado de vagas nas Licenciaturas de Comunicação/Jornalismo

Na linha da diminuição do número de licenciaturas em Comunicação/Jornalismo, têm vindo a decrescer também as vagas, mas num ritmo mais acelerado: depois de um pico em 2007/2008 (2072 lugares disponíveis), foram decrescendo até ao actual ano lectivo (1298). A verificar-se a tendência de redução de cursos, é de esperar que se mantenha ou acentue o recuo das vagas.

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A contabilização dos cursos incorpora o ensino superior politécnico e universitário; privado e público. Foram considerados os cursos que integram o “jornalismo” ou o exercício da profissão de “jornalista” no seu “perfil de formação”, nas “saídas profissionais” ou como “ramo” ou “especialização”(a partir do que cada curso publica no respectivo site), independentemente do peso da componente de Jornalismo no seu plano de estudos. Estes dados não incluem as vagas dos cursos da U. Católica Portuguesa, porque não são publicamente divulgados.

Os dados de 1996/1997 foram deduzidos a partir do trabalho mais abrangente (área da Comunicação) de Mário Mesquita e Cristina Ponte, que pode ser consultado aqui. Para contabilizar os cursos nos restantes anos lectivos, foi consultado, a cada ano, o site da DGES.

Opiniões#12

1) Que vantagens vê numa formação académica em Jornalismo/Comunicação para o exercício da profissão de jornalista?

Tenho alguma dificuldade em responder a esta pergunta porque iniciei a minha carreira no Jornalismo numa altura em que a oferta de formação académica era muito escassa em Portugal e a profissão se aprendia pela prática, pela “tarimba”. Essa prática foi a base de toda a minha carreira e nunca senti que a falta de formação académica fosse um entrave para evoluir e progredir, dentro das empresas onde trabalhei. Ainda assim, a determinada altura da vida e da carreira, decidi procurar a formação académica para colmatar algumas falhas que comecei a sentir na minha rotina de trabalho, como a dificuldade em conseguir algum recuo no pensamento de mecanismos de funcionamento da profissão que deixamos de questionar, ou a necessidade de compreender o “outro lado” do Jornalismo. Daí que, dentro do curso de Ciências de Comunicação, tenha escolhido uma especialização em Publicidade e Relações Públicas. Isso ajudou-me a compreender melhor, por exemplo, o trabalho de assessoria de imprensa que, até aí, não conhecia tão bem e do qual, confesso, mantinha alguma distância, baseada na desconfiança natural entre jornalistas e assessores.

Daquilo que conheço da formação levada a cabo pelas universidades portuguesas, julgo existir o perigo dos alunos saírem para o mercado de trabalho com boas ferramentas para pensarem o Jornalismo, mas pouco conhecimento prático para o desempenhar plenamente. No contacto com estagiários, saídos de diferentes universidades, fico muitas vezes com a sensação que se eles tivessem formação académica noutras áreas científicas poderiam ser mais úteis às redacções onde se integram, apenas com alguma prática jornalística.

2) Que resposta deve a formação académica dar aos efeitos da associação do mercado e das novas tecnologias ao jornalismo?

A Academia deve, na minha opinião, formar profissionais preparados para enfrentar a realidade do mercado onde se vão integrar. E isso implica, claro está, uma adequação dos curricula. Isto não pode, no entanto, desvirtuar a formação de profissionais que garantam o exercício do Jornalismo, de acordo com os cânones que dele fazem um contribuinte fundamental para uma sociedade democrática, livre e independente.

No que às novas tecnologias diz respeito, a aprendizagem da sua utilização e, sobretudo, a adequação ao meio, é fundamental em qualquer tipo de formação académica. Tratando-se de um desafio relativamente novo para o próprio Jornalismo, uma vez que democratização da tecnologia potencia o aparecimento de novas formas de exercício da profissão, não deixa de ser um desafio também para o ensino do Jornalismo. Por se estar ainda a desbravar caminho nesta área, julgo que as universidades têm um papel preponderante na definição de rumos para uma nova geração de jornalistas.

3) Defende uma formação sobretudo técnica (estudo e prática da técnica profissional) ou alicerçada numa componente mais reflexiva (estudo do Jornalismo integrado no universo mais vasto da Comunicação)? Porquê?

Julgo que, num mundo ideal, uma formação que consiga levar aos alunos a dose certa de reflexão e prática jornalísticas, contribuirá para a formação de melhores profissionais. Partindo do meu próprio exemplo, em que a formação foi sobretudo prática e só (muito) mais tarde procurei enquadrar esse conhecimento quase empírico nos alicerces da Comunicação, defendo um ensino que confira aos estudantes a possibilidade de adquirirem as bases de uma formação teórica que lhes permita reflectir sobre a prática, mas também dominarem a técnica de forma a não se sentirem perdidos diante do mundo real. Penso que as universidades ainda não conseguiram este equilíbrio e a falta de profissionais “no activo”, no corpo docente de grande parte das instituições de ensino superior, faz resvalar a formação para uma componente teórica, mais próxima da investigação na área das Ciências da Comunicação, do que da prática do Jornalismo.

4) Que ligação deve existir entre a academia (cursos de Jornalismo/Comunicação) e a profissão, durante o período lectivo e na fase de estágio?

Uma ligação bidireccional, estreita e de compromisso permanente, durante todas as fases de aprendizagem, lectivas ou de estágio. As universidades deviam recorrer com mais frequência a profissionais do Jornalismo na orientação de aulas práticas, que facilitem o contacto dos estudantes com a realidade das redacções.

Na fase de estágio curricular, pela experiência que tenho, muitas vezes os estudantes são “largados” num ambiente que lhes é completamente desconhecido e até hostil, dependendo o sucesso da experiência, da força de vontade do próprio e da boa vontade do orientador, que tem de acumular o acompanhamento do estágio com o normal desempenho da sua função na redacção. É também nesta fase que os laços com a academia me parecem necessitar de maior reforço, porque os estudantes se dão conta da fragilidade do conhecimento adquirido, no confronto com a realidade.

Duarte Valente | UMinho | Jornalista RTP